Vale Oferece R$ 100.000,00 por Vítima

UTILIDADE PÚBLICA! MUITO IMPORTANTE!

VALE OFERECE R$ 100.000,00 (CEM MIL REAIS) POR VÍTIMA

Diversas pessoas estão me consultando pelas nossas redes sociais sobre essa notícia que saiu nos jornais de hoje, querendo saber minha opinião, se devem ou não aceitar o dinheiro e, se aceitarem, se abrirão mão dos demais direitos que tiverem.

Claro que não vou deixar de ajudar, ainda mais nesse momento de tamanha dor e da imensa necessidade das famílias que perderam seus entes queridos.

Vamos pular a parte emocional dessa questão tão dolorosa e tentar ser mais práticos. Nada vai trazer os entes queridos que partiram de forma tão trágica de volta.

Nada!

Muitos dos que faleceram, contudo, eram arrimos de família.

Mantinham suas casas ou ajudavam muito no orçamento familiar. Suas ausências, além da dor insuportável que já provou, ainda vai causar muitas privações financeiras aos seus entes queridos, que ficaram.

Meu aconselhamento, nesse sentido, é que recebam, sim, o valor ofertado pela empresa, o mais rapidamente possível.

É bem provável que a Vale, através de seus advogados, obriguem os beneficiários a assinarem documentos que dêem quitação desses valores, e que colham declarações dos familiares, no sentido de que não procurarão a Justiça para receber seus direitos complementares.

Em meu humilde parecer, como Advogado, não acredito que nenhum juiz vai entender e aceitar que, assinar esses documentos, retira dos beneficiários das vítimas a possibilidade de, em um futuro próximo, revindicarem seus demais legítimos direitos, que certamente existem, e que certamente ultrapassam o valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais) oferecido pela Vale.

Qualquer declaração ou termo de recebimento e quitação, que tenha a pretensão de retirar da Vale a sua responsabilidade plena, cível e criminal, a meu ver, será completamente anulável em juízo.

Não somente pela gravidade da situação, mas, principalmente, pelo precário estado psicológico dos familiares nesse momento, além de suas necessidades imediatas, fatos que, associados, caracterizam o chamado vício de consentimento.

Assim, recebam o valor e amenizem suas dificuldades momentâneas. Leiam os documentos que lhes derem para assinar e, se houver qualquer declaração de quitação ou isenção de responsabilidade futura, escrevam uma ressalva no documento, dizendo que não aceitam os termos.

Se se recusarem a pagar, devido à ressalva, assinem e recebam. Não tenho dúvidas de que os juízes serão não somente favoráveis a vocês, mas como punirão a Empresa, ainda mais severamente, no caso de ocorrer essa lamentável tentativa de coação.

Dentro do possível, responderemos as perguntas de todos, sempre de forma privada, e sempre garantindo o sigilo e a privacidade de todos vocês, que passam por uma dor inimaginável, em que a perda dos entes queridos se mistura à sensação de revolta pelo descaso com as vidas que se perderam.

Com o tempo, posso lhes garantir, a dor dá lugar à saudade que, ainda assim, continuará a doer, mas de uma forma cada vez mais amena, menos angustiante.

E a vida seguirá o seu curso natural para os que ficaram, que ainda têm muito o que fazer por aqui.

Deus nos abençoe a todos.

E que Ele tenha recebido em seu colo todos os que se partiram de forma tão trágica e repentina, deixando um oceano de saudade, nunca de lama, nos corações de todos que os amaram e sempre amarão.

Por toda a eternidade!

Belo Horizonte (MG), 30 de janeiro de 2019.

 

André Mansur Brandão
Diretor-Presidente, Advogado

ANDRÉ MANSUR ADVOGADOS ASSOCIADOS

Quanto VALE uma Vida?

Brumadinho: crime ou tragédia?

 A triste e revoltante reprise de um recente filme da vida real, que provocou a morte de diversas pessoas e a destruição da vida de milhares de outras em Mariana, volta a ocorrer em Brumadinho, em proporções ainda mais graves.

Poucas vezes na vida fiquei sem palavras. Desde pequeno, eu falo o tempo todo. Falo e escrevo, sem parar. Com o passar dos anos, fui ficando mais seletivo, mas continuo falando e falando … E falando.

Por isso, tenho tanto medo de me manifestar sobre o que está acontecendo em Brumadinho, Minas Gerais. Tenho medo de falar algo do que eu possa me arrepender depois.

Infelizmente, não controlo isso. Mesmo sem palavras, vou ter de falar. Senão, posso me sufocar.

A dor e a indignação por Mariana ainda estão na garganta. Uma cidadezinha histórica, perto da formosa Ouro Preto, a pouco mais de cem quilômetros de Belo Horizonte. Vidas e histórias destruídas.

Agora, Brumadinho. A linda e aconchegante Brumadinho. Pertinho de BH, um dos roteiros turísticos mais visitados. Desde o conhecido Instituto Inhotim, até a simples e aconchegante cidade, com suas lindas e acolhedoras pousadas. É Minas para todo lado.

Meu filho e seus colegas estavam lá, há pouco mais de um dia dessa tragédia criminosa. Congelo minhas pernas só de pensar nisso.

Muito pouco depois do vazamento da barragem, comecei a receber mensagens, de todo o tipo, vindas de todas as partes. Desespero total. Pânico, angústia, sofrimento, enfim, toda sorte de sentimentos ruins criaram uma densa nuvem de dor sobre nossa região.

E assim, estamos, até agora. Imersos na dor. E apavorados pelo fato de que o pior pode ainda não ter acontecido em sua abjeta plenitude.

Ao mesmo tempo em que vidas são procuradas na lama, ainda existe o forte risco de novas rupturas de outras barragens, irresponsavelmente localizadas na região.

Canalhas! Dessa vez, vocês vão ter de pagar!

O preço da impunidade é a reincidência criminosa. Três anos depois de Mariana e ninguém sequer chegou perto da prisão. Ninguém foi responsabilizado.

Exceto as milhares de vidas vitimadas pela Samarco. Sim, foram milhares. Não somente as vidas perdidas, mas todas as que foram tocadas pela destruição, pelo desamparo ou pelo desemprego, que seguiu o curso do Rio Doce, até chegar no mar.

Vidas arrancadas. Vidas tocadas, da pior forma possível.

Criminosos! Isso é o que vocês são: criminosos!

Apesar da revolta, a hora é de fé, de esperança. O governador do Estado de Minas, em mais uma infeliz manifestação, afirmou que somente serão resgatados corpos, da lama.

Ele está errado!

Novamente. Ainda há vidas a serem salvas. Eu tenho certeza de que muitas vidas ainda surgirão, seja da lama, ou de qualquer lugar oferecido por Deus para proteger seus filhos.

Muitos perderam tudo. Mas ninguém pode perder a esperança.

Feito o rescaldo, temos de passar o Brasil a limpo. Não temos muito tempo. Antes que aconteça de novo. E de novo, e de novo.

Até que chegue o dia em que, estaremos tão acostumemos com a dor, que não mais a sentiremos, por estarmos anestesiados ou insensíveis, pela banalização da vida humana, diante do interesse mesquinho dos que somente querem lucrar.

Que Deus abençoe e ajude a aliviar a dor de todos os que sofrem por suas perdas, e que Ele possibilite que mais pessoas sejam encontradas com vida.

E que essa nuvem de dor, que paira sobre todos nós, mineiros e brasileiros, possa dar lugar ao sol da esperança, de um futuro próximo, com mais segurança e decência, para todos nós.

Ninguém vai descansar, enquanto não houver JUSTIÇA!

A todos, que sofrem com essa dor, que não consigo sequer imaginar, que Deus esteja com todos vocês, aliviando seus corações, confortando-os nesse momento de tamanhas provações.

 

André Mansur Brandão
Diretor-Presidente, Advogado e Escritor

ANDRÉ MANSUR ADVOGADOS ASSOCIADOS

Ensaios Sobre a Tortura!

Quais os limites do ser humano? Seria possível quantificar, em números, a dor a que um homem pode ser submetido?

Ela deveria ter em torno de 40 anos de idade. Talvez mais, talvez menos. As roupas que vestia permitiam concluir que não vinha de uma família rica. Nem pobre.

Trajes comuns, ela não era gorda, nem magra. Cabisbaixa, era fácil concluir que estava sofrendo. Gemia baixinho, de forma quase imperceptível.

A dor que sentia era intensa, pulsante e viva. A dor que tinha se tornado sua companheira dos últimos dias, aumentava, aos poucos, a cada longo segundo que se passava naquele lugar.

O lugar onde estava sentada era pouco iluminado. Uma espécie de corredor, frio e embolorado. Quando lá chegou, sentiu um forte odor de fezes e vômitos, que se misturava ao cheiro de adrenalina que exalava de outras pessoas que se sentavam ao seu lado.

Seus companheiros de corredor entravam e saíam, lentamente. Mas ela não os conseguia identificar, mais. Após tantas horas naquele lugar fedido, e diante do intenso sofrimento de seu corpo e de sua alma, ela somente conseguia detectar vultos disformes.

Gritos de dor, choros desesperados eram ouvidos com uma frequência enlouquecedora. Sim, ela estava enlouquecendo.

Com sua mão esquerda, ela segurava seu braço direito, visivelmente fraturado, de forma grave, como era possível concluir pelo enorme inchaço no local.

Dores lancinantes, gritos desesperadores, alma cansada. Estaria ela em algum tipo de inferno?

Seu nome era Maria da Conceição. Não se considerava uma pessoa boa, nem má. Era comum, tinha um emprego comum e vivia uma vida comum. Não entendia o porque de tanto sofrimento.

Conceição, como era chamada por seus poucos familiares e colegas de trabalho, estava naquele local há mais de 40 horas. Para ela, todavia, parecia uma eternidade, diante de tanta dor e sofrimento.

Tentava se manter sóbria, lúcida, sem desmaiar, mas suas forças já davam sinais de derrota. Ela estava extenuada, exaurida. Nem mais conseguia chorar, como fazia logo que a levaram para aquele lugar horrível.

SENHORA MARIA DA CONCEIÇÃO! – gritou uma voz masculina, rouca, quase brusca.

 MARIA DA CONCEIÇÃO – repetiu a voz, dessa vez quase gritando.

 Alguém a estava chamando. Quase sem enxergar, já que a dor tinha ultrapassado quase todos os limites humanos, ela se arrastou com dificuldades na direção da voz.

 Um homem pequeno estava de pé, no corredor, e a aguardava de forma impaciente. Sem conseguir enxergar sua fisionomia, ela parou diante dele e aguardou que dissesse algo.

 O homem, então, asseverou:

 – Vá até o final desse corredor, e entre na sala 26. O doutor fulano de tal irá atender a senhora.

 Lentamente, dirigiu-se ao local indicado pelo homem. Lá chegando, um jovem médico a aguardava. E, após quase dois dias de espera, a senhora Maria da Conceição conseguiu, enfim, ser atendido no posto de saúde da grande cidade onde morava.

 Sei que vocês estão surpresos, correto? Achavam que Conceição estava em um porão da tão temida ditadura? Negativo!

 A cena acima me foi descrita por essa mulher, cujo nome foi trocado, para fins de manter a sua privacidade. Mas, certamente, ela não é e nem será a única pessoa a passar pelo inferno para ter acesso a um atendimento médico de urgência (ou de emergência), de forma minimamente digna.

 Nos últimos meses, em nosso País, muito se falou sobre as torturas ocorridas e documentadas nos chamados porões da ditadura militar brasileira.

 Impossível negar a ocorrência de vários casos de supressão dos direitos humanos de pessoas que eram contra o sistema e o governo militar.

 Não é disso, entretanto, que estamos falando agora.

 A corrupção é a pior forma de tortura que existe.

Retira dos cidadãos seus direitos mais elementares, como o direito à vida, à saúde e à dignidade humana.

A dor que um torturador convencional pode impingir a um ser humano é apenas uma pequena parte da dor que o corrupto impõe a milhares de milhões de pessoas, pelo Brasil afora.

A tortura individual pode levar um homem à morte, lenta e cruel. A ação dos vermes, que atacam as verbas públicas com a sua ambição criminosa, destrói, de forma igualmente ardilosa, a vida e a esperança de toda uma sociedade.

A corrupção provoca dores, humilhações e a morte lenta de inúmeras pessoas. E, assim como devemos repudiar a tortura individual, devemos sentir nojo de toda forma de corrupção, por mais simples e inofensiva que possa parecer.

A parte mais complexa é saber diagnosticar, de forma precisa, como a corrupção se manifesta, na sociedade, através de nosso comportamento individual.

Vamos analisar algumas situações corriqueiras da vida cotidiana.

Parar um carro na fila dupla, na porta das escolas. Realizar ultrapassagens pelos acostamentos das rodovias. Furar a fila nos cinemas ou lanchonetes. Falsificar um documento de identidade, para parecer mais velho, e poder entrar em determinados shows e espetáculos?

Reconhecem alguns desses comportamentos? Claro que sim!

Ainda assim, mesmo que pratiquemos “pequenos”se e “inconsequentes” atos de corrupção, revoltamo-nos, quando essa mesma corrupção manifesta em nível nacional, praticada por terceiros.

As pequenas imperfeições individuais ganham escala gigantesca, quando o homem passa a ter acesso ao poder.

E toda a sociedade acaba sendo, ora vítima, ora cúmplice, dessa abjeta forma de corrupção que destrói o mundo, retirando da senhora Maria da Conceição, e de milhões de outros seres humanos, espalhados pelo Brasil e pelo mundo, não somente o direito a uma saúde de qualidade, mas o próprio direito à vida e à liberdade de sonhar.

Pensem nisso. Pois a vítima de uma sessão de tortura pode ser você!

Reflitam e fiquem com Deus!

 

André Mansur Brandão
Diretor-Presidente, Advogado e Escritor

ANDRÉ MANSUR ADVOGADOS ASSOCIADOS

 

 

 

 

 

Nunca Deixe de Sonhar!

No mundo real, infelizmente, a grande maioria das histórias não têm um final feliz.

A parte boa da vida é que podemos, em muitas situações, mudar o mundo e nossa vida, transformando situações de grande adversidade não somente em uma forma de aprendizado, mas, também, em vitórias.

Para se transformar fracassos em sucessos basta sonhar? Infelizmente não. Mas já é um grande começo.

Vou contar para vocês uma pequena história que pode ou não ter acontecido, que fala do estranho encontro entre sonhos e realidade.

Era uma vez …

Em uma cidade grande do Brasil, uma pequena família lutava contra muitas dificuldades. Mãe, pai e dois filhos pequenos, uma menina, de cinco anos e um menino, que mal tinha completado nove.

Mãe e pai, ambos desempregados, chegados do interior do estado de Minas Gerais, há quase um ano, morando em um pequeno cubículo, na periferia da cidade. Filhos ainda fora da escola, por absoluta falta de condições da família.

Todas as economias do casal tinham sido consumidas e as contas já começavam a se acumular por sobre a mesa da pequena sala, que praticamente se emendava com o único quarto do barracão.

Além de desempregado, o pai ainda padecia de fortes dores nas pernas, provenientes do árduo trabalho no campo, que durante anos agrediu seu corpo frágil.

O pouco dinheiro que ainda insistia em sobrar somava pouco mais de cem reais, sendo que, somente as contas de água e de luz, já vencidas, totalizavam quase cinquenta reais.

CEMIG e COPASA eram, respectivamente, as concessionárias de luz e água daquela cidade e castigavam com cobranças insistentes, humilhantes e ameaçadoras.

Já havia três contas vencidas de cada uma delas e os cortes de luz e água eram questão de tempo. Além de todas os problemas inerentes ao desemprego e à falta de recursos, ainda teriam de ficar no escuro e sem água para beber ou fazer a sua higiene pessoal.

Era uma situação desesperadora!

Para evitar o corte iminente, e por estar com dificuldades de se locomover, o pai pediu ao filho pequeno, de nome João, para pagar as duas últimas contas da Cemig e da Copasa, apenas uma de cada.

Deu a ele quatro notas de dez reais e duas de cinco, suficiente para pagar as contas que totalizavam R$ 49,62, sem os encargos, que viriam nas próximas faturas. Pagando essas duas contas, os cortes seriam evitados, dando à família, pelo menos mais trinta dias de tempo.

Apesar de muito novo, saiu o menino em direção à casa lotérica, de uma certa forma orgulhoso com a missão que lhe tinha sido confiada. Corria, ansiosamente, pois o horário de fechamento estava muito próximo. Se passasse das oito horas da noite, não conseguiria pagar as contas.

Logo na entrada, deparou-se com um cartaz que anunciava:

LOTERIA: CONCORRA A DOIS CARROS DE UMA SÓ VEZ. SORTEIO AINDA NESTA NOITE!

Os olhos do menino começaram a brilhar. Dois carros de uma única vez!

Resolveria todos os problemas da família. Um deles certamente seria vendido pelo pai e o dinheiro revertido para pagar as suas dívidas e mudarem para um lugar melhor.

O outro? Claro. O outro ficaria com eles e seria usado para fazerem inesquecíveis passeios, todos juntos, felizes, como ele via nos comerciais. Era a solução.

O valor do bilhete? Exatamente os cinquenta reais que ele tinha em mãos. Certamente era um sinal de Deus. Tinha de ser!

Pensou por quase meia hora. E tomou a decisão: comprou o bilhete, voltando correndo para seu barraco, onde seus pais já o aguardavam impacientes e aflitos, devido à demora e ao avançado da hora.

Quando o menino comunicou aos pais sobre sua decisão de não pagar as contas, usando o dinheiro para comprar um arriscado bilhete de loteria, ambos se desesperaram.

O pai não se conteve e começou a chorar copiosamente, enfiando sua cabeça no velho travesseiro que usava para dormir.

A mãe, igualmente alterada, caminhava nervosamente pelo pequeno espaço, de um lado para outro, ora dizendo frases desconexas, ora praguejando contra a vida e a tamanha falta de sorte da família.

O menino caminhou lentamente para o cantinho onde dormia, perto da irmãzinha, e começou, também, a chorar, baixinho. Até seu pequeno corpo ceder ao cansaço e à tristeza que sentia.

A pequena casa, com seus quatro moradores, adormeceu!

No dia seguinte, bem cedinho, batidas fortes na porta acordaram todos, de sobressalto.

Ao saírem, deparam-se com a seguinte cena:

DOIS CARROS NA PORTA!

Eram a Cemig e a Copasa, que tinham chegado para cortar a luz e a água.

E assim termina a história!

Para os que nesse momento querem me bater, eu vou confessar: é uma piada, transformada em conto. E com uma dose grande de humor afrodescendente.

Vocês deveriam ter desconfiado do final quando eu disse que o nome do menino era João. Exatamente, o lendário Joãozinho deixou sua família no escuro e sem água.

Até as histórias, todavia, têm uma lição de moral.

Na vida, sempre procuramos atalhos para sairmos de nossas dificuldades, quando a solução, que sempre existe, sempre será através de muito esforço e superação.

Esse conto, em forma de piada, não foi baseado em fatos reais. Reflete, contudo, a situação de miséria vivida por milhões de brasileiros.

Outros tantos milhões nem sequer possuem energia elétrica, água encanada, esgoto e saneamento básico.

Devemos pensar nisso, antes de reclamarmos de nossas vidas, por motivos muito menos sérios. Se até quem vive na miséria sabe que ainda existem pessoas em situações piores. Aqueles que agonizam, doentes, muitas vezes em condições terminais de suas vidas.

Vivamos mais, com mais bom humor. Sem amargor, e sem descontarmos nas pessoas que nos cercam nossa dor ou nossos problemas, nem sempre tão graves.

Vamos ser felizes, antes que Deus, o juiz da vida, apite o fim do jogo. Viver sempre tem de ser melhor do que morrer.

Concluo, lembrando que a vida somente vale a pena se nunca deixarmos de sonhar. Mas, quando tivermos uma conta para pagar, vamos pagar. Senão a Cemig e a Copasa aparecem com seus carros.

Que Deus nos abençoe a todos!

Fiquem com ELE!

André Mansur Brandão
Diretor-Presidente, Advogado e Escritor

ANDRÉ MANSUR ADVOGADOS ASSOCIADOS

Vete De Arrascaeta Y No Vuelvas Mas

Vá embora, De Arrascaeta! E não volte.

Lembro-me de quando vi Arrascaeta pela primeira vez. Era uma partida válida pela Copa Libertadores da América, do ano de 2014.

O ônibus do time do Defensor, do Uruguai, entrava lentamente no estádio Mineirão, escoltado por diversos policiais.

Em volta, um verdadeiro inferno azul, formado por gritos, fogos de artifício, bandeiras e uma multidão de torcedores cruzeirenses, que gritavam palavras de ordem, para intimidar o adversário do Cruzeiro naquela noite.

O ônibus era um modelo duplo-deck, esses de dois andares, mas dava para ver nitidamente os jogadores do Defensor inclinados nervosamente na janela.

Dois rostos destacavam-se, na penumbra interna do veículo. Em uma das janelas podíamos ver Gedoz, um jogador brasileiro, que servia à equipe uruguaia.

Em outra janela, um pouco mais à frente, estava Arrascaeta, então uma jovem e tímida promessa do futebol sul-americano, quase desconhecido da mídia futebolística.

Uma coisa imediatamente me chamou a atenção: ao contrário de Gedoz, que se mantinha estranhamente calmo, diante do mundo azul que o tentava intimidar, Arrascaeta estava muito nervoso e ansioso.

Nada anormal, já que ele era um atleta jovem, que jogaria, em instantes, contra uma equipe muito maior do que a sua, em um jogo de grande importância para seu clube e suas aspirações pessoais.

Quando entrou em campo, a jovem promessa deixou o nervosismo de lado e começou a se mostrar, naquele jogo, para o futebol mundial.

Deu assistência para o primeiro gol do Defensor e ainda fez o segundo, impondo ao Cruzeiro um amargo empate em 2×2, em pleno estádio Mineirão. Aos traumáticos 48 minutos do segundo tempo.

No ano seguinte, 2015, foi oficialmente contratado pelo Cruzeiro e, naquele momento, nasceu De Arrascaeta, agora, sim, uma real promessa para o futebol mundial, visto que usaria um dos mais sagrados mantos do futebol sul-americano e, porque não dizer, do futebol mundial.

A segunda vez em que o vi, já vestindo o uniforme do Cruzeiro, foi no estacionamento G2 do Mineirão, lugar onde são estacionados os veículos de luxo dos jogadores, além dos demais carros de autoridades, membros da imprensa e usuários de camarotes e cadeiras especiais (meu caso).

O jogo havia acabado e meu filho e eu esperávamos para tirar fotos com os atletas e com a comissão técnica, um passatempo a que nos dedicamos desde 2013, quando o novo Mineirão foi reinaugurado.

Arrascaeta chocava por ser muito franzino. Nem de longe imaginávamos que aquele garoto, que tinha a compleição física de um menino, seria, um dia, ídolo de uma das grandes torcidas de futebol do Brasil.

Pequenino e frágil, usava um capuz para encobrir sua cabeça, deixando à mostra somente o rosto, quase imberbe. Olhava para baixo o tempo todo, como se tivesse vergonha. Ou medo da multidão de torcedores que começavam a assediá-lo.

Para que as pessoas que não são cruzeirenses possam entender o motivo de toda a revolta de nossa torcida contra a saída do jogador para o Flamengo, é importante que conheçam esse breve histórico do jogador.

Não foi a saída dele que nos irritou, mas sim a forma como isso aconteceu.

Chegou fraco, franzino e inseguro, tendo recebido do Cruzeiro todo o apoio, até mesmo para conseguir ganhar massa muscular, já que era “leve” demais para o futebol atual.

Para os que não sabem, o Cruzeiro é um time-família. Abraça e acolhe a todos que chegam, com afeto e generosidade.

Atletas, principalmente os mais jovens, são tratados de forma carinhosa e pessoal. Quantos clubes no Brasil teriam mantido o zagueiro Dedé, após tamanho histórico de contusões que, para muitos, tornariam-no inviável para o futebol?

O Cruzeiro deu à Arrascaeta não somente o suporte técnico, médico, fisioterápico e nutricional, mas toda a assistência psicológica para não “queimar” a jovem promessa, já que o uruguaio nunca soube lidar bem com pressão, apesar de ter sido decisivo em algumas partidas, certamente fruto do suporte do grupo de jogadores e de Mano Menezes, de quem o jogador sequer se despediu, antes de virar as costas para o clube.

Encorpado, alimentado, treinado e preparado emocionalmente, De Arrascaeta foi convocado para a seleção de seu país. Pouco fez durante a Copa do Mundo, mas voltou e recebeu, novamente, todo o suporte do Cruzeiro.

Ignorou tudo isso e, de forma lamentável, encerrou sua a relação com o Clube que lhe projetou. Mais do que isso: com o clube que o acolheu, como dificilmente outro o fará. Não de forma tão afetuosa.

Não se trata de querer privar um jogador de crescer profissionalmente, de querer receber mais. Isso é comum, já que o futebol profissional contemporâneo preconiza o TER, em detrimento do SER.

A forma como saiu, e como fechou as portas do time que dele tão bem cuidou, mostrou uma face de seu caráter, que será uma marca que o acompanhará para o resto de sua vida.

E não adianta tentar colocarem a culpa em algum empresário supostamente ambicioso. O jovem uruguaio é um homem, adulto e independente, e deve ser responsabilizado por suas atitudes e submeter-se às consequências delas.

Cruzeiro é time grande, time de massa, acostumado a ganhar títulos, assim como o é o Flamengo.

Contudo, o rubro-negro da Gávea encontra-se refém de sua história recente, onde não ganha títulos importantes há anos. Lá, a pressão vai ser muito, mas muito maior.

E todos sabemos que De Arrascaeta não aguenta pressão. Se por dinheiro, virou as costas para o Cruzeiro e saiu, sem se despedir até de seus colegas, o que faria por medo?

Se abandonou o Cruzeiro, que tudo lhe deu, o que impedirá de fazer o mesmo com o Flamengo, quando o Maraca começar a tremer e a cobrar?

Como diria o rapper Eminen, na música LOSE YOURSELF, o jovem uruguaio terá, no Flamengo, apenas ONE SHOT, ONE OPORTUNITY.

Sim, um tiro, uma oportunidade. Apenas uma chance para dar certo.

Não falhe! A grande nação rubro-negra não o perdoará, caso isso aconteça.

Se você não valer o que pagaram, e o Flamengo ficar, novamente, apenas, sentindo o cheirinho de títulos, você experimentará um outro tipo de odor: o do medo.

Ou, o que é pior: o amargo perfume do ostracismo, do esquecimento.

Pode ser que minhas palavras pareçam de rancor. E devem ser mesmo.

Sou passional e amo o meu Cruzeiro. Estamos todos magoados com a forma ofensiva como esse jogador literalmente cuspiu no prato que o alimentou, usando de uma expressão popular.

Pelo menos me declaro parcial, e não me escondo sob o falso manto da isenção jornalística, expediente usado por alguns maus profissionais de mídia que torcem descaradamente para esse ou aquele time, enquanto publicam informes publicitários disfarçados de notícias.

Não se esqueça de que a bela e vitoriosa história do Cruzeiro continua, assim como a do Flamengo, enquanto a do jogador, que sai pela porta dos fundos da Toca da Raposa, ainda deve ser escrita.

Você manchou a sua história, não a nossa.

A galeria de ídolos do Cruzeiro possui centenas de jogadores que marcaram as chamadas páginas heróicas imortais. Brasileiros ou estrangeiros, homens de fibra e de caráter escreveram no livro eterno do Clube.

Somente usando o passado recente, podemos citar Everton Ribeiro, Goulart, Sorin, Alex, dentre outros, que entraram de forma definitiva para a história de sucesso do Cruzeiro.

Não somente pela forma como jogaram e defenderam o manto azul, mas, principalmente, pela maneira como saíram. Ou como encerraram suas carreiras. Acredite, De Arrascaeta, um dia, sua carreira vai terminar.

O que sobrará, quando você olhar para trás?

Homens de caráter e pessoas decentes saem pela porta da frente, pela porta que entraram, e não têm vergonha de olhar nos olhos de quem os recebeu. Homens de verdade não olham para o chão, pois não tem vergonha de seus atos.

Não conheço sua história, nem sei das dificuldades pelo que passou até se tornar um jogador de ponta.

Parece, porém, faltar-lhe conhecimento sobre a história e a vida dos milhões de torcedores cruzeirenses que insuflaram seu ego nas arquibancadas, proporcionando-lhe contratos financeiros sempre mais polpudos.

Você nem imagina pelo que passam uma mulher, um homem ou uma criança, em um país pobre, com tantas misérias e desigualdades, para ir a um estádio de futebol, gritarem e incentivarem o time do coração, ou comprarem a camisa 10, que você usou, mas onde cuspiu ao sair como saiu.

Não me refiro, apenas, aos milhões de pobres que, muitas vezes, deixam de comer, para prestigiar o time que os representa.

Jogadores são guerreiros, que entram nas partidas, com a missão de lavar a alma de todos. Como heróis azuis, rubro negros, de todas as cores, que lutam, em nome de milhões, contra as injustiças e mazelas que a sociedade impõe aos que pouco ou nada possuem.

Para nós, é paixão. Para você, é dinheiro. Pena que não soube entender isso e separar uma coisa da outra.

Torço, ironicamente, para que você continue a brilhar. Primeiro porque tenho afinidade e simpatia pelo Mengão.

Além disso, você é um bom jogador. Talvez seja mesmo um craque. Proporcionou-nos, nesses anos, muitas alegrias, vitórias e conquistas.

Como apaixonado pelo futebol que sou, gosto do talento, que você parece ter.

Dificilmente, todavia, a vida deixa de cobrar daqueles que separaram o ESTAR do SER.

Nossas atitudes, tanto as certas quanto as erradas, nos acompanharão pelo resto de nossas vidas. Assim como suas consequências. Para muito além dos 40 anos de idade, quando se encerra a carreira de um jogador de futebol.

Você, todavia, é jovem. Ainda tem muito a aprender, como todos nós.

Se existe alguém que pode mudar, esse alguém é jovem. Pois a juventude sempre tem, diante de si, nada menos que o futuro. Ainda que a juventude, um dia, acabe.

 

André Mansur Brandão
Diretor-Presidente, Advogado e Escritor

ANDRÉ MANSUR ADVOGADOS ASSOCIADOS

Participaram, também, Mônica Mansur, como revisora e André Victor Mansur, como pesquisador.

 

 

 

 

 

O Infeliz

Sua vida não era pior nem melhor do que a de ninguém que ele conhecesse. Não que conhecesse muita gente.

Na verdade, era uma pessoa muito solitária, apesar de estar sempre rodeado de pessoas, sempre barulhentas e desagradáveis.

Tinha um emprego medíocre. Não era bem remunerado, mas seu trabalho não lhe exigia mais do que a presença de seu corpo físico durante aproximadas cinquenta horas semanais, sentado a uma mesa, sempre lotada de documentos sem sentidos, a que lhe cabia destinar para diversos setores da empresa.

Não tinha namorada. Ou namorado, apesar das inúmeras insinuações de seus colegas de trabalho no sentido de uma possível homossexualidade.

Quatro horas por dia eram consumidas dentro de coletivos, ora apertados demais, ora vazios o suficiente.

A única coisa que realmente lhe dava prazer na vida era observar a cidade onde morava. Um balneário praiano, sempre muito frequentado por turistas do país inteiro e muitos de outros lugares do mundo.

Morava de aluguel em um barracão, quarto e sala, em uma casa localizada no final de uma vila de pescadores, próximo a uma ponte que cobria a parte profunda do manguezal, usada por vários veículos para atravessar para o outro lado da cidade.

Ele gostava de ver o encontro do mangue com a parte mais caudalosa do mar.

Da mureta da ponte, dava para ver a exuberância do oceano, tocando o céu, em um espetáculo único que a natureza lhe proporcionava: um lindo horizonte, ora dourado, ora cinzento, que sempre tocado o mar com delicadeza e arte.

Sentar-se perto do acesso à ponte, era realmente a única coisa que lhe proporcionava algum tipo de prazer em sua vida medíocre. Chegava do trabalho e ia para um pequeno banco de cimento, já devidamente estragado pela ação do tempo e da maresia.

E lá ficava, por horas e horas. Até voltar para o cubículo onde morava.

Após uma refeição, requentada e sem sabor, deixada por uma empresa de marmitas, tomava um rápido banho, lavando-se desconfortavelmente na pouca água que gotejava do chuveiro frio.

Banho tomado, roupa limpa, seu corpo cedia, enfim, ao cansaço.

Sua mente adormecia, mergulhando-o na noite. Uma noite longa demais, de sono, mas sem sonhos, que se prolongava até o despertar do dia seguinte, até começar de novo a sua vidinha.

Ele era realmente um completo infeliz!

Durante os fins de semana, o peso de sua vida sem sabor era mais leve. Tinha mais tempo para observar as pessoas que caminhavam, felizes e perfeitas, pela praia, perto da ponte.

Mulheres e homens perfeitos. Famílias ideais, que poderiam ser a sua, com quem não mantinha contato há anos.

Homens e mulheres, correndo como atletas, rostos e corpos perfeitos, como se flutuassem sobre o chão, em uma linda, mas dolorosa sinfonia.

Qual era o critério que Deus usava para distribuir a felicidade? Por que Ele dava tanta coisa para tantas pessoas, enquanto sua vida era tão insossa, tão sem graça?

Repentinamente, uma presença feminina roubou-lhe de seus tristes pensamentos. Não era a primeira vez que ele a via ali. Mas ela estava especialmente deslumbrante naquele fim de tarde.

Se muito, deveria ter uns trinta anos. Seus cabelos, negros e longos, contrastavam com a pele muito clara, mas ligeiramente avermelhada, dando um tom rosado àquela face de anjo, certamente fruto da ação do sol, tomado na dose ideal.

Sempre que passava pelo banco de cimento, perto da entrada da ponte, ela o cumprimentava, educadamente, movendo levemente o rosto. Era o tipo de mulher que sorria com os olhos. Era perfeita!

E como era linda!

Que tipo de homem mereceria de Deus a sorte de desposar aquele anjo de perfeição?

Como seria maravilhoso construir uma família com uma pessoa tão perfeita…

Ela não devia ser como as demais mulheres, que o olhavam por cima, como se ele sequer existisse.

Além de ser linda, ainda era gentil e educada. Certamente não era alguém com quem ele pudesse sequer sonhar. Já que sonhos nunca foram uma opção. Pelo menos não que ele se lembrasse.

Uma mulher perfeita como aquela desposaria um homem perfeito. Teriam filhos perfeitos e viveriam em uma casa luxuosa, confortável, com diversos banheiros e chuveiros com água quente e caudalosa.

Certamente ela deveria ter um emprego empolgante, algo que a fizesse saltar da cama, todos os dias, excitada e vibrante, para irradiar sua perfeição por onde quer que passasse.

Não, sonhar com essa vida, para ele, era quase um pecado. Nunca poderia ser feliz assim. Não com aquela mulher perfeita!

Seus pensamentos foram bruscamente interrompidos por gritos, vindos de um grupo de pessoas que estava perto da ponte. O inexplicável, o impossível aconteceu.

A mulher perfeita havia subido no beiral da ponte e saltado, para a morte certa. Morte confirmada, pouco mais de duas horas depois, após o resgate de seu corpo, outrora tão belo, agora inerte, sem vida.

Socorristas e policiais realizavam suas funções, de forma rápida e hábil, como se estivessem acostumados a lidar com aquela trágica situação com frequência.

Uma multidão de curiosos circundava a cena, enquanto o cadáver da mulher era

examinado por algum tipo de polícia técnica.

O homem aproxima-se de seu corpo.

Reconhece-a imediatamente, principalmente pelos cabelos, ainda molhados e sujos de areia, mas estranhamente sem perder sua viscosidade e beleza. Não havia dúvidas de que era o corpo da mulher perfeita.

Uma espécie de lona preta é colocada sobre seu corpo sem vida. O vento lateral batia fortemente sobre o mar, criando um clima ainda mais bucólico para a triste cena.

Ele sequer sabia o nome daquela mulher.

Permaneceu de pé por mais de duas horas, até o momento em que um carro do Instituto Médico Legal retirou o corpo da praia, fazendo a multidão dispersar-se rapidamente, até sobrar, somente, o homem, que vagarosamente inicia o caminho de sua casa, pensando: o que será que leva uma pessoa a fazer algo tão terrível contra si mesmo?


O conto acima, infelizmente, não somente foi baseado em um caso real, como aconteceu de fato. Pelo menos a parte do suicídio da jovem mulher é totalmente real, tendo acontecido em uma cidade litorânea do Brasil.

Eu estava de férias na região e assisti na reportagem da TV local todos os detalhes dessa tragédia.

O homem que eu usei para criar o conto talvez seja real, talvez não. Um cliente havia me ligado dois dias antes e reclamou muito comigo sobre sua vida, sua tristeza.

As coisas que ele me falava chocavam, por eu nunca imaginar que ele pudesse estar se sentindo tão mal, apesar de as pessoas olharem para a vida dele, de fora para dentro, e desejarem viver aquela vida.

Tudo isso aconteceu por volta das festas de final de ano, período em que crescem muito os casos de suicídios.

Tive diante de mim dois casos reais. Um, de um homem que sofria, por se achar profundamente infeliz. E outro, uma mulher jovem e bonita, que havia saltado de uma ponte, para a morte certa.

Os dois casos conflitavam, mas se completavam. Um, se achava infeliz, mas não sabia de fato o porquê.

A mulher havia atingido tamanho grau de desespero que imaginava não existir outra opção para aliviar a sua dor.

Algo que me chamou muito a atenção foi o fato de que, de acordo com o depoimento de testemunhas, a mulher sequer pensou para saltar. Chegou, subiu na mureta da ponte, e pulou, sem ao menos vacilar.

Nossa profissão de Advogado coloca-nos o tempo todo em contato com desgraças humanas. São frequentes vidas e almas despedaçadas nos procurarem com seus sonhos desfeitos e pesadelos reais.

Por toda a fé que eu tenho em Deus, é claro que sou totalmente contra o suicídio, como forma de alívio para a dor extrema. Eu bem que sei o quanto viver pode ser doloroso.

Sei, entretanto, que viver é maravilhoso, sensacional, e agradeço cada dia de minha vida e da minha família a Deus.

Eu bem que sei que as aparências enganam, como aconteceu no conto acima, que mistura duas realidades em uma fantasia real. Parece confuso, mas não é!

Olhamos a vida das pessoas de fora para dentro. Raros são os que mostram, externamente, seus infernos interiores.

E isso não é nada bom, pois quando alguém consegue, de fato, matar-se, destrói a vida dos que ficam, sejam amigos ou parentes que, além da dor normal da perda de alguém que se ama, ainda se sentirão sempre culpados por não terem percebido uma dor tão grande, que conduz alguém ao ponto de se matar.

Se você está sofrendo, peça ajuda. Sempre haverá alguém que lhe ama. Não cometa o erro de achar que estamos sozinhos nesse mundo.

Parte da tristeza é referencial.

Ficamos ainda mais tristes se comparamos nossas vidas com a das demais pessoas, que se mostram tão felizes, tão perfeitas, como a mulher que se matou, no conto acima e na vida real.

Aconteça o que acontecer, tanto a tristeza extrema, quanto a alegria surreal, vão passar. Tudo é questão de tempo.

E de fé!

Concluo, deixando para vocês uma fábula de Esopo, recontada por La Fontaine que, com rara felicidade, fala sobre como lidar com a tristeza, mostrando que a morte sempre é um desígnio de Deus, um fechamento para a nossa existência terrena, para quer possamos seguir com nossas vidas, em um lugar onde a morte não existe.

Um pobre lenhador, vergado pelo peso dos anos e da lenha, que às costas trazia, caminhava gemendo, no calor do dia, sentindo por si próprio o mais cruel desprezo.

A dor, por fim, foi tanta que ele até parou e, pondo ao chão seu fardo, pôs-se a refletir:

Que alegrias tivera em seu pobre existir? Depois de tanta vida, algum prazer lhe restou?

Faltara, às vezes, pão; descanso, nunca houvera;

Os filhos, a mulher e o cobrador, à espera;

O imposto e a cara feia do soldado…

Ele era um infeliz, completo e acabado!

Pensando nessa falta de alegria e sorte, chamou em seu auxílio da morte.

“Vosmecê me chamou, e eu vim. Agora venha.”

“Só te chamei pra me ajudar com a lenha…”

A morte tudo conserta, mas pressa não deve haver, pois a sentença é bem certa: antes sofrer que morrer.

 

André Mansur Brandão
Diretor-Presidente

ANDRÉ MANSUR ADVOGADOS ASSOCIADOS